Às vezes sinto que minha própria casa é uma grande armadilha. Ela está cheia de lembranças que preferiria evitar. Ou mesmo deveria.
Na sala, existe o sofá em que você deitava. Eu me lembro de uma vez em que você lia um texto após termos brigado. Eu estava cansado... tão cansado de debater sempre sobre as mesmas coisas, de não sair sempre do mesmo lugar. Então eu perguntei por que estávamos assim. Você não soube responder.
No cozinha, estão os utensílios que você trouxe de casa. Quando olho para eles, sinto-me até um pouco culpado por não ter achado que você queria construir um lar. Talvez você realmente quisesse. Por que afinal estão lá agora um puxa-saco, uma pedra de amolar, um protetor de bolo... todos a me observarem diariamente, com um olhar de reprovação e sem nada a dizer.
No quarto, é a cama o que mais dói. Tenho de dormir toda noite, retornar meu olhar para o lado e constatar que você já não está mais lá. E dormir abraçado ao travesseiro que eu comprei para você. É ele você?
Por vezes também lembro dos perigos mais escondidos. Dos poucos presentes que você me deu. Seu trabalho escolar, não tenho coragem de pegar, de ver novamente, de ler novamente. Até hoje não sei exatamente por que você mo deu. Seria porque eu dera meu coração em forma de dragão de pelúcia na semana anterior? Ou realmente você estava tentando trasformar-me em parte de sua vida? Eu não soube dizer. Ainda não sei.
E talvez a maior armadilha seja essa minha insistência em lembrar... em tentar dissecar o que já não tenho mais. Mas não sei como não o fazer. É minha casa, afinal... os fósforos que você comprou continuam na gaveta - ainda não acabaram. O produto de limpeza que você indicou não esgotou nem em um terço. Eu devia criar coragem e jogá-los fora... e jogar toda casa fora. Acho que você nunca percebeu que essa casa eu fiz para você. Eu não poderia impor o fardo a um amigo de dar abrigo a um terceiro. Seria abusar demais. Então eu saí da casa que construí por três anos para ficar finalmente sem lar nenhum. Porque onde estou agora é você e eu não o tenho mais.
Meus amigos perguntam por que estou assim. Por que fui assim. No fundo, realmente não há sentido. Afinal, o que foi você? Um punhado de utensílios e um livro com retratos antigos... uma briga em um supermercado em pró da carne de dezoito reais o quilo. Um nunca 'obrigado por me ensinar, por me apoiar, por me amar sem que eu pedisse por isso'.
Então eu vou continuar dentro desta grande armadilha. Esperando o dia em que os fórforos acabem, que a cama perca tamanho, que o limpa-vidro evapore e que aquela criança que sorri nas fotos finalmente vire um homem e olhe nos meus olhos para dizer o que eu nem sei o quê.
Na sala, existe o sofá em que você deitava. Eu me lembro de uma vez em que você lia um texto após termos brigado. Eu estava cansado... tão cansado de debater sempre sobre as mesmas coisas, de não sair sempre do mesmo lugar. Então eu perguntei por que estávamos assim. Você não soube responder.
No cozinha, estão os utensílios que você trouxe de casa. Quando olho para eles, sinto-me até um pouco culpado por não ter achado que você queria construir um lar. Talvez você realmente quisesse. Por que afinal estão lá agora um puxa-saco, uma pedra de amolar, um protetor de bolo... todos a me observarem diariamente, com um olhar de reprovação e sem nada a dizer.
No quarto, é a cama o que mais dói. Tenho de dormir toda noite, retornar meu olhar para o lado e constatar que você já não está mais lá. E dormir abraçado ao travesseiro que eu comprei para você. É ele você?
Por vezes também lembro dos perigos mais escondidos. Dos poucos presentes que você me deu. Seu trabalho escolar, não tenho coragem de pegar, de ver novamente, de ler novamente. Até hoje não sei exatamente por que você mo deu. Seria porque eu dera meu coração em forma de dragão de pelúcia na semana anterior? Ou realmente você estava tentando trasformar-me em parte de sua vida? Eu não soube dizer. Ainda não sei.
E talvez a maior armadilha seja essa minha insistência em lembrar... em tentar dissecar o que já não tenho mais. Mas não sei como não o fazer. É minha casa, afinal... os fósforos que você comprou continuam na gaveta - ainda não acabaram. O produto de limpeza que você indicou não esgotou nem em um terço. Eu devia criar coragem e jogá-los fora... e jogar toda casa fora. Acho que você nunca percebeu que essa casa eu fiz para você. Eu não poderia impor o fardo a um amigo de dar abrigo a um terceiro. Seria abusar demais. Então eu saí da casa que construí por três anos para ficar finalmente sem lar nenhum. Porque onde estou agora é você e eu não o tenho mais.
Meus amigos perguntam por que estou assim. Por que fui assim. No fundo, realmente não há sentido. Afinal, o que foi você? Um punhado de utensílios e um livro com retratos antigos... uma briga em um supermercado em pró da carne de dezoito reais o quilo. Um nunca 'obrigado por me ensinar, por me apoiar, por me amar sem que eu pedisse por isso'.
Então eu vou continuar dentro desta grande armadilha. Esperando o dia em que os fórforos acabem, que a cama perca tamanho, que o limpa-vidro evapore e que aquela criança que sorri nas fotos finalmente vire um homem e olhe nos meus olhos para dizer o que eu nem sei o quê.
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