segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Especial

Depois que você foi embora - talvez não logo depois, mas algum tempo depois -, eu me pus a procurar algo. Como a barra de chocolate - que não adquiri a tempo -, queria que tivesse alguma prova; algum sinal de que você me faz diferença, de que é especial. Pensei em escrever um texto, mas isso parecia um pouco frágil, um pouco forçado talvez. Porque já não tenho a inocência de meus quinze anos, já não tenho a coragem de outrora, ainda que a gana permaneça. Então, busquei um escrito antigo, alguma parte de mim. Como se também fosse necessário provar que eu sou especial, para que pudesse ter vontade de estar comigo. Não que eu não tenha deixado meu interesse claro - talvez não exatamente que tipo de interesse. Como aquelas cenas em filmes, ou em livros, em que a personagem cética, por algum detalhe mínimo, vê o que estava há tanto diante de seus olhos. E deixa seus medos de lado - os atira pela janela -, e junto com o antiherói ganha a chance de sorrir novamente.
Entretanto, eu não me vejo como nenhum dos dois. Queria. Talvez até mais o primeiro, o que consegue desenvolver uma capacidade nova de amar, que não seja a óbvia paixão fulminante. Porque é nesta que sempre me ancorei. Sei tão pouco de você e talvez justamente por isso sinto essa atração. Não que a parte desconhecida seja ruim - pode ser que sim, pode ser que não. Mas é justamente o mistério - encapsulado nesse lindo sorriso - que deixa nesse estado de latência. E também não que isso seja superficial ou desanconselhável. Porque são tão raros os desejos de me entregar, de querer tentar... então pouco importa que venham de um lugar irracional, emotivo, simplório. Porque a combinação de uma atração com uma possibilidade de mutualidade, mesmo que remota, é a esperança que tenho.
O que mais vai me fazer sorrir? Eu passo os dias fazendo planos, tentando construir um caminho infalível e, ao mesmo tempo, lidando com minha incapacidade de fazê-lo. Daí vem minha angústia, o tapa na cara que me diz: você não está no controle. Eu não estou em meu comando, e muito menos estou no seu. Então, eu posso tentar me convencer de que algo que eu fizer irá dar certo, irá despertar em você o que você despertou em mim. Mas estaria me convencendo do mesmo modo que faço com o restante de minha vida. E então eu falho. E sigo tentando.
Sei que não é perfeito. Sei que não irá suceder. E, se suceder, que não irá durar. Mas eu tenho que aprender a aproveitar o presente. Quando você estava aqui, em algum ponto eu me peguei pensando sobre como você poderia estar se sentindo e, por isso, não dei atenção ao que estava sucedendo a mim. Que estava beijando essa rapaz ridiculamente atraente, sentindo a textura de sua pele, o cheiro de seu cabelo. E me dei conta de tudo que estava perdendo. Então eu parei. Parei para prestar atenção em cada detalhe do seu corpo, em seu jeito de falar, de gesticular. Tentando construir uma memória que durasse, que me pudesse fazer sorrir quando você já não estivesse mais.
Agora, que alguns dias já passaram, algumas mensagens já passaram, a memória está seguindo seu curso, se desmanchando. E queria tanto poder fazer outras. Poder pegar esse sentimento ridículo e mesquinho, quase egoísta, e transformá-lo em uma oportunidade de construir amor. Porque senão... Se não?! E se não?
Está tudo bem. Vou guardá-lo em meu coração. Vou confiar naquele garoto de quinze anos que costumava dizer "eu te amo" tantas vezes, até sua alma se encher novamente. Você me a encheu novamente. Me fez senti-lo de novo. Por isso, justamente por isso, você é especial.