quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Sobre o amor

Quando cheguei, ele estava sentado na entrada de uma loja, na esquina entre as duas ruas, onde havíamos combinado de nos encontrar. Me viu e logo se levantou. No mesmo instante, minhas pernas começaram a tremer; podia sentir as palavras saindo já embaralhadas de minha boca. Para evitá-lo, fui dar um beijo de cumprimento. Ele me deteve. Fiquei paralisado por alguns segundos, tentando entender o que aquilo significava. Ou simplesmente fiquei paralisado. Eu não esperava. Eu não esperava ele que fosse o rapaz da foto e, ainda que o fosse, que não tivesse o quê... um e noventa. Talvez mais. Me senti tão pequeno. Tão invisível. Aquele homem alto, forte, bonito. No meio da noite escura com um rapaz assim... Não feio, mas nada que chamasse muito a atenção. Certamente, não pelo corpo. E talvez nem mesmo pelo rosto. Um cara normal. Tão distante dessas pessoas lindas, esculpidas. Essas pessoas que parecem poder ter tudo e todos que querem. Por isso, podia ver a imagem de ele indo embora, dando uma desculpa qualquer para justificar a interrupção repentina. Mas ele não foi.

- Você toma cerveja? Sim. Mas não tenho em casa. Creio que há algum lugar aberto. Mas, ali, na rua principal. Onde há luz. Onde transitam pessoas. Eu tentava manter o passo firme. Não falar muito. Não me relaxar. Era preciso ser rígido, porque ele não podia perceber que eu era uma bicha dessas que a gente já identifica logo de cara. Dessas que até falam grosso, mas que quando riem são claramente bichas. Eu tinha que ficar firme. 

- Eu percebi que você não era daqui. Brasileiro, é? A loja estava perto. Mas continuávamos na rua escura, em que não passava ninguém. - Quer ir para a Dezoito? Acho que a loja é por aqui. Viramos o cruzamento e atravessamos o sinal. Eu queria olhar. A vergonha não me deixava. Não tinha esse direito. - Eu não trouxe minha carteira. Tudo bem. De fato, eu estava sem a carteira. Tive medo de que fosse um assaltante, por isso deixei tudo em casa. E mesmo assim escondido. Apenas uma nota de mil mais acessível. É tudo que tenho, poderia falar e talvez ele fosse embora sem levar mais coisas, sem me machucar. Porque alguém como o da foto não iria querer me encontrar. Não iria querer vir à minha casa no meio de uma noite vazia. Alguém assim poderia ter qualquer um. Tinha que ser outra pessoa. Ou, mesmo que não, que quisesse algo de mim que não havia explicitado. Objetos pessoais, dinheiro, ou me fazer mal. 

Em poucos minutos, já estávamos na porta do prédio. Eu peguei a chave, abri a porta e deixei ele entrar primeiro. - Segundo andar. Ele, porém, não começou a subir: esperou que eu fosse na frente. Apertei o interruptor da luz e caminhei em direção à escada. Um, dois, quatro, tantos degraus. Quantos degraus? Era como se eu contasse um por um, mas perdesse a conta a cada passo; até chegar à porta. - Pode passar. Ele entrou e eu fui para o quarto procurar a carteira, pegar os cem pesos que custou a cerveja. Já não importava mais. Ou já não temia mais.

- Não precisa. Tem certeza? Certeza. Você se importa se eu fumar um? Fico muito nervoso. Não, tudo bem. Sabe... a última vez que fiz isso já tem dois anos.. talvez um pouco mais. Não costumo sair com caras. Eu gosto de mulher, na verdade. É que de vez em quando dá vontade de sair com cara. Mas é difícil encontrar algum que me atraía. Com mulher, é muito mais fácil. Gosto de todas. Mas homem não. Então tem uns dois anos acho. O último cara era um pirralho. A gente não fez muita coisa. Saímos uma três vezes. O pau dele era muito, muito grande. Então não deu para... você sabe. Não tinha como. Vou abrir a cerveja. Não, não, pode deixar que eu abro.

Já não sabia o que estava fazendo. Minha mão tremia enquanto deixava a cerveja cair no copo. Levantei mais a garrafa para fazer um pouco de espuma. Enquanto isso, ele estava sentado, fumando o cigarro de maconha que acabara de enrolar. Peguei os dois copos, dei um para ele e me sentei também. O que você faz? Estuda? Está aqui estudando, né? Sim, cheguei tem uns sete meses. Vou embora em junho. Um ano. E você? O que faz? Sou médico. Mas queria fazer outra coisa, sabe? Se eu pudesse, voltaria a estudar e faria outra coisa. E tenho um filho. Te falei que eu tenho um filho? E esposa. Mas eles estão viajando. Por isso que pude sair. 

As palavras, entretanto, logo se acabaram. Ficamos sentados, cada um de lado. Ele ocupava todo o espaço do sala, e eu ali, tão pequeno, parecia que iria desaparecer entre as almofadas. Parecia que iria sumir de minha própria casa, porque já não havia espaço nenhum. E o silêncio tão curto se alongava: o cigarro havia acabado, a bebida já quase também. Não havia mais o que dizer. Respirei fundo e tentei me transformar em alguém que já fui. Ou em alguém que nunca fui. Sentei mais perto, bem mais perto, e coloquei minha mão em cima de sua perna.

- Olha, eu não beijo. Tudo bem? E pôs a mão sobre minha bermuda. Sobre meu pênis. E começou a acariciar. Abri o zíper, ou ele abriu o zíper. Não estava ereto. Mesmo assim, ele começou a chupar. Ele me chupava, e eu tentava ver seu corpo, tentava tocá-lo. Passava as mãos por suas costas. E comecei a deslizá-las em direção a sua bunda. Ele levou um pouco. Ergueu-se um pouco do assento para que meus dedos alcançassem mais fácil. Então o puxei e ele se sentou do outro lado. Segurei as suas pernas para cima e me inclinei para lambê-lo. 

Minhas mãos ainda estavam trêmulas. Há tanto tempo eu queria estar com alguém que desejasse tanto. Que desejasse mais do que pudesse comparar. E ele estava ali. Mas não podia beijá-lo, não podia fazer carinho. Me sentia na permissão de no máximo tocar seus órgãos genitais. Nada mais que isso. Ele não estava ali. Eu não estava ali. Ele voltou a chupar meu pênis flácido. Eu, sentado, e ele, de joelho no chão. Um homem forte, alto e tão bonito. Eu o queria tanto. Queria olhar para seu rosto e acariciar suas mãos. E talvez até quisesse que ele chupasse meu pau e que eu gozasse em sua boca. Mas nem isso podia. Eu não tinha nada, apesar de ter tudo.

Depois que gozou, ele foi tomar banho. Eu fui depois. Voltei para sala, e ele estava sentado, de bermuda. - Podemos nos ver outra vez, se você quiser. Me escreva. Pode ser que eu demore a responder, porque sou casado, tenho um filho, te falei, né? Sou bastante ocupado. Mas a gente se fala. Calçou o tênis e eu fui vestir uma roupa para acompanhá-lo até embaixo. - Então a gente se fala. E me inclinei para dar um beijo em seu rosto. Ele rapidamente fez um movimento para trás e me estendeu a mão. - Boa noite, foi um prazer te conhecer. 




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